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Diário de um vagabundo chamado Billy Tord ou viagens ao sótão panorâmico 1

Diário de um vagabundo chamado Billy Tord ou viagens ao sótão panorâmico João Cunha Silva 19 de Janeiro de 1973 Dizem que não necessitamos de nada que não seja dado pela natureza. Acredito mesmo que para matar o tempo livre começamos a inventar coisas supérfluas, só para nos entretermos e fugirmos daquele medo ancestral de estarmos sozinhos. A verdade é que não nos suportamos. Seria cansativo e odioso conseguirmos viver connosco próprios. A dependência dos outros é assim a droga mais viciante, mesmo que o outro esteja lá apenas de corpo presente, sem se mexer, como uma jarra com plantas artificiais e para sempre mortas no seu interior. Detestamos também a sensação de termos que lidar com as nossas falhas e preferimos sempre que seja alguém a apontar, uma a uma, essas mesmas falhas. Penso mesmo que se não fossem essas anormalidades comportamentais, passaríamos pela tempestade dos dias sem que notassem a nossa presença. Aprendi a estar sozinho. Continuo a aperfeiçoar essa arte n...

A escama dourada de João Cunha Silva

Pastilha para a insanidade (tomar apenas a dose recomendada)

Pastilha para a insanidade (tomar apenas a dose recomendada) Outra palavra se faz Da sua inútil utilidade palavra para sítio certo que cumpre o que diz, sem saber que o faz. Palavra operária Escrava de horas, Que se levanta e se deita Na linha, ao ritmo bafiento Da rotina apressada, Palavra da palavra, Que apenas diz o que diz E mais nada. Quero a palavra brinquedo, A palavra de certo recreio, Que me faça brincar com ela. Sem medo e sem receio. Quero a palavra pincel, Que pinte tudo sem ordem, Rabisque sem ter destino, Até não ter mais papel. Quero a palavra do sonho A palavra que traz a magia Essa, é a única que nos ajuda A viver por mais um dia. JCS 2016

Uma palavra

Uma palavra Brinca no ar Soprada de lado para lado Leve, fresca Brinca, rodopia Brinquedo de menino Grande ou pequenino Descansa cansada na folha Finge ser orvalho de uma manhã fria Que depressa escorre até ao rio, até ao mar só para depois voltar a brincar no ar. JCS 2016

Feira do Livro do Porto

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Há na rua por onde passo

Há na rua por onde passo Há na rua por onde passo uma porta de cor vermelha. Todo o dias a vejo Naquele sorriso tímido Escondido no vestido escarlate Juro que fala E me diz bom dia Respondo, é claro! Não fica a falar sozinha. Por vezes apanho-a distraída E aí sopro os bons dias primeiro. Abrando e aguardo a resposta Que me ilumina o resto do dia. Ao passar tiraria o chapéu, por certo ...isto se o tivesse. Tenho mesmo de arranjar um chapéu... É isso! Um Fedora, como o meu avô. Dar-me-á o ar distinto que a ocasião pede Irá gostar, por certo, mas não posso ter a certeza: Nunca lá entrei; nem espreitei; Apenas vi o sorriso da caixa de correio entreaberta À espera de novas em forma de carta Escrever-lhe-ei uma carta, Sim, da próxima vez que passar Hoje não, que já lá não passo de novo.

A poesia não serve para nada

A poesia não serve para nada Não serve mesmo! Após longa reflexão e depois de muitas leituras sobre o assunto, chego à feliz conclusão que a poesia não serve mesmo para nada. Não lhe vejo qualquer serventia ou utilidade. Acho mesmo que deve ser a coisa mais inútil do mundo. De todas as invenções humanas, a poesia deve ser muito provavelmente a pior, logo a seguir, é claro, ao tapete voador (como é que alguém limpa os pés num tapete voador!??) Comparando com o “clip”, que praticamente dá para fazer tudo o que se consiga imaginar, a poesia cora de vergonha perante a sua completa inutilidade. Aqueles que ocupam o seu tempo a escrever poesia são uns verdadeiros tontos, que se deviam ocupar a escrever coisas, é claro, mais úteis: ofícios, palpites para o placard, notícias, sei lá bem…qualquer coisa que menos ocupe uma página inteira e não desperdice os restos das linhas. A esses tontos, para além de serem um bando de preguiçosos, deve faltar muito vocabulário pois deixam muitas vezes ...

Quem tem medo da democracia?

Quem tem medo da democracia? Não há nada mais perigoso do que uma boa ideia posta em prática por gente fraca, irresponsável e dotada de uma cartilha de valores, no mínimo, questionável. Refiro-me à União Europeia, é claro! A União Europeia assenta as suas origens em ideias valorosas e realmente positivas, a que ninguém, de perfeito juízo, pode estar contra: a paz e a livre circulação de pessoas e bens dentro deste espaço comum. Como em tudo na vida, de nada serve uma boa ideia, se esta for posta em prática de forma pouco inteligente. É do senso comum que qualquer união só valerá a pena se a soma for maior do que as partes: é assim que funciona com as pessoas, e é assim que funciona com as organizações. E é claro que quem se junta com outro, e aqui até podemos entrar na natureza das relações humanas, tem de estabelecer um conjunto de regras, fazer um determinado número de cedências, para que essa mesma união seja possível. Pesados os prós e os contras, o resultado dessa união, isto n...

O que eu quero é o mar;

O que eu quero é o mar; sorver a maresia, deixar-me salgar. Quero escrever na areia, versos efémeros, passageiros, que durem a eternidade da onda e se misturem na espuma. Quero o mar poema, cheio de lágrimas e versos, calmos, na ordem certa, ou revoltos, indomáveis, tomados pelo vento. Quero o mar, poema eterno, tecido na cadência das ondas, escrito no seu desmaio, declamado na sua força. Quero o mar, livro em branco que me receba palavra a palavra Verso a verso quadra a quadra Quero ser mar, Quero ser onda, espuma, Quero ser sal Quero ser a palavra que, temperada pela maresia, seduz o sabor dos dias. Aí o mar se faz poema, e o poema é nada mais do que mar! Jcs 2016

Palavra Maldita

Palavra Maldita E a palavra, soletrada, presa nos dentes, ou livre com vento nas asas. Que seja dita pois nunca será maldita. Que procure tempo ameno, No voo em bando de uma frase Ou enfrente tempestades, num verso bravio que não rima …mas, que seja dita, pois nunca será maldita. Que não fique presa, pesada, Carregada da cor do tempo e lhe fuja o momento. Que seja apenas dita com cadência, ou tropeção, verso nobre, ou palavrão …mas que seja dita, pois nunca será maldita! Jcs/2016