Fugir da derrota como o diabo da cruz

Fugir da derrota como o diabo da cruz

Escrevo esta crónica na véspera da partida da nossa seleção para França. É claro que só posso desejar que nos proporcionem dias de alegria, e claro, que desta vez o caneco venha para cá. Não peço menos. Aliás, não concebo que se entre numa competição sem ser para ganhar. Pode-se perder; ficar pelo caminho; escorregar em frente à baliza; pode até o poste impedir o tal golo da vitória; podemos mesmo não ganhar um único jogo e nem sequer marcar um único golo, mas… ninguém deve partir para uma competição sem ser com o objetivo de ganhar. Se não for assim, mais vale não competir. Claro que perder faz parte do jogo, mas quem se prepara para perder, muito dificilmente ganha. É mesmo uma questão de atitude. Não se confunda isto com falta de desportivismo, pois uma coisa é aceitar a derrota e outra coisa é não se importar com a derrota.

Para que se queira mesmo ganhar, há que ver as derrotas como a pior coisa que pode acontecer, e sejamos francos, como estamos a falar de um jogo, é mesmo a pior coisa que pode acontecer. Devemos fugir da derrota como o gato foge da água, ou como diabo foge da cruz, ou os extremos fogem do Bruno Alves (não resisti). Acho que ninguém duvida que é inconfundivelmente melhor ganhar do que perder. Podem até dizer que aprendemos mais com as derrotas, mas argumento que só precisa de aprender com as derrotas, quem ainda não sabe o caminho da vitória e precisa de ver alguma coisa de positivo no falhanço que teve. Por isso venham as vitórias e preparemo-nos para elas, pois a vitória é a única coisa que se deve preparar antes do jogo: as derrotas são resolvidas depois. Aliás, na vida acontece o mesmo: preparamo-nos para o sucesso, estudando para testes, exames, apresentações, entrevistas de emprego e só depois é que teremos de lidar com o insucesso, caso surja e para ser mais correto, no momento em que surgir, pois esse momento é inevitável. No desporto, enquanto metáfora da vida, deve-se cerrar os dentes e dar tudo por tudo enquanto existir hipóteses de êxito. Não se confunda “dar tudo por tudo”, ou seja, o melhor de nós, com fazer “de tudo” como quem diz que qualquer meio justifica o fim desejado. Não é isso a que me refiro. Refiro-me a “dar tudo por tudo” dentro das regras do respeito pelo outro, dentro das regras da civilidade, dentro das regras do jogo.
Só se dando tudo por tudo é que se “engole” de uma melhor forma o sapo da derrota. E só quando isso acontece é que o espumante da vitória sabe realmente bem, pois do outro lado esteve alguém com objetivos máximos, que não conseguiu ganhar graças ao nosso mérito. O problema de Portugal, enquanto país, é que nos contentamos com fumos de vitória, ou ficamos estupidamente embevecidos quando nos consideram favoritos. Por outro lado, vemos todas as derrotas de forma igual, em que tudo terá de ser refeito.
Um vez que detesto o discurso dos coitadinhos, é com alegria que vejo Fernando Santos a dizer o óbvio: queremos ganhar. Haverá algum mal nisso? Será falta de humildade ou mesmo falta de desportivismo? Acho mesmo que é o inverso. O desportivismo nunca passa por não querer ganhar; passa sempre por admitir que, mesmo no máximo das nossas forças, não conseguimos ganhar porque o outro foi melhor. Para mim nunca tive dúvidas que qualquer vitória tem a dimensão de quem foi derrotado.
Como isto é uma questão de atitude, há que começar desde novos. Por isso se quiserem ensinar o que é desportivismo, nunca digam aos vossos filhos que perder e ganhar é desporto…soa-me a treino de derrotados e isso ninguém quer. Digam que é normal sentir-se triste quando não se ganha, digam que num jogo há sempre dois lados a esforçar-se para ganhar, digam-lhes que se devem preparar para a vitória e finalmente digam que estarão sempre lá para lhes dar um abraço apertado ou dois caso não ganhem.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

#Paris

(A)Mar