O colchão dos ricos, a confiança e o cheque em branco
O colchão dos ricos, a confiança e o cheque em branco
Ninguém tem dúvidas que uma das vantagens da democracia é a sua capacidade de regeneração e ajustes contínuos em função dos tempos, das necessidades e da vontade coletiva. Nenhum outro sistema protege desta forma a sua sobrevivência e se estudarmos a história, todos os outros tipos de governo faliram por não se conseguirem propagar nos anos ou sobreviver à ausência do seu ditador. Até na China, um sistema tão complexo que nem me atrevo a explorar a fundo, a manutenção do sistema atual só é possível pela sua capacidade de se projetar nos tempos, quebrando dogmas e barreiras que confundem aqueles que ainda estão enclausurados dentro de fronteiras ideológicas.
No entanto, a nossa civilização assentou e assenta no pressuposto que a palavra democracia só se poderia associar ao sistema capitalista, mesmo que controlado, em oposição ao sistema comunista, completamente controlado pelo estado. Em boa medida, todas as democracias ocidentais assentam neste tipo de sistema. Mas será mesmo assim?
Os últimos dados saídos do escândalo do “Panama Papers” comprovam algumas suspeitas e mostram-nos que não é bem assim.
Por todo mundo, populações inteiras são levadas a pensar que vivem em democracias, que escolhem, que tomam partido, que são donos do seu próprio destino. Mero teatro de sombras! Votam e elegem, mas as decisões são tomadas por grandes grupos de advogados que defendem os seus próprios interesses e os interesses dos seus clientes. Para além disso, temos o diretório da União Europeia que mais se assemelha a um qualquer Comité de uma China qualquer (não é assim tão diferente, bem vistas as coisas). Os governos são eleitos, mas apenas para cumprir o que foi estabelecido numa torre de marfim qualquer, independentemente da realidade e muitas vezes contra ela.
As populações têm forçosamente de acreditar que o sistema funciona para o sistema funcionar, pois só assim continuam a aceitar que tirem impostos dos seus rendimentos. Estaremos no limite dessa crença e mais uma vez a história mostra-nos que nada será como antes depois deste sismo com epicentro no Panamá. As populações já não se enganam com bolos, ou será que sim?
Gostava hoje de ter os dados para poder comparar o peso específico dos impostos sobre os rendimentos num orçamento de uma qualquer democracia ocidental e veríamos que o verdadeiro problema dos estados sociais passa pelo facto de muito poucos contribuírem para o bem comum: os mais pobres porque não podem, e os mais ricos porque não querem e conseguem esconder os seus rendimentos dos sistemas fiscais, escondendo-os nos colchões dos ricos: os tais “Off Shores”.
Todos os sistemas proporcionam estas desigualdades e esta propensão para proteger os interesses dos mais poderosos, mas a democracia é sem dúvida a melhor mentira; é a melhor forma de dar bolos a tolos; a melhor forma de fazer com que 98% mantenha o nível de vida dos restantes 2% da população. Mas só come bolos quem quer, eu não passo cheques em branco.
Todos já sabíamos que vivíamos num mundo-cão, só faltava a respetiva ilustração para quem ainda tinha dúvidas ou alguma esperança na existência de alguma ética no mundo.
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