Estado de (in)segurança
Estado de
(in)segurança
Não me perguntem o que é viver com medo. Não saberei responder. Posso
apenas imaginar um sobressalto constante, um estremecer a todo o momento e um
mal-estar difícil de explicar, mas que rói, desgasta e que nos tolhe a vontade
de viver. Não é segredo que a base da nossa civilização assenta na confiança no
outro, regido por um código de regras implícitas e explícitas que nos permitem
viver em sociedade. Eu confio que posso atravessar uma rua, cruzar-me com
desconhecidos sem ter medo de sair ferido deste ato banal. Eu confio que me
posso sentar numa esplanada, descontrair, sem me preocupar ou ter sequer a
mínima suspeita que tudo irá pelos ares, ou que um tresloucado, pendurado numa
janela de um carro, irá começar a descarregar um carregador inteiro de uma AK.
É esta confiança nos outros, assente na previsibilidade de comportamento
social, mesmo com os seus inúmeros problemas, que caracteriza a sociedade
ocidental. Se esta é uma das nossas características principais é perfeitamente
normal que nos ataquem neste pilar civilizacional. E isto é exatamente o que me
assusta. Uma bomba numa praça cheia de civis, num aeroporto ou num metro tem
mais consequências do que aquelas que causa diretamente: molda-nos
comportamentos, altera-nos a forma de viver. Podemos mesmo dizer que este tipo
de ataques é terrivelmente eficaz e o seu efeito é simplesmente devastador.
No entanto, pergunto-me sempre se não estaremos a capitular perante os
ofensores quando a nossa resposta é mudarmos aquilo que somos, mudando os
nossos comportamentos, aumentando as leis de vigilância social. Estaremos a
transformar os nossos estados iguais a todos aqueles estados ou organizações
que abominamos e combatemos. É um tempo urgente, bem sei, mas sinto sempre uma
espécie de urticária na pele, quando aceitamos que se prenda ou invada
liberdades sem provas, sem mandato, e principalmente sem motivo. No entanto a
resposta tem sido sempre a mesma: restringir liberdades. Bem sei que é sempre
delicado escolher entre segurança e liberdade; ambas devem estar sempre
presentes, mas na dose certa. Não há verdadeira liberdade sem segurança, mas o
aumento exagerado da dose de segurança levará inevitavelmente ao fim da
liberdade.
Somos pois todos colocados perante este dilema: até que ponto estaremos
dispostos a ceder a nossas liberdades para termos segurança. Sinceramente
custa-me ver um estado intrometido, mas custar-me-á mais, sem qualquer dúvida,
ter um estado negligente que ignora os “sinais de fumo” visíveis a todos.
Sinto, por fim, que nunca poderemos controlar aquilo que é injustificável e
que sai fora dos comportamentos explicáveis. Nem com um polícia para cada
cidadão, nem com todas as nossas conversas analisadas ao detalhe, nem sendo
seguidos ao segundo. Resta-nos esperar e confiar que quem estiver ao nosso
lado, seja em que lugar esteja ou seja do mundo, venha por bem, pois nada o
impede de agir mal… a não ser a sua consciência.
Je suis pour l’humanité!
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