A gestão do silêncio

Agora conto eu…A gestão do silêncio

No meio de uma conversa não há nada mais importante do que a correta gestão do silêncio. É das coisas mais difíceis de fazer e penso mesmo que só ao fim de uns anos de vida é que se consegue na medida exata, controlar com eficácia o silêncio. Acho mesmo que chega a ser uma arte: há quem tenha um natural talento, mas para haver mestria é necessário praticar e treinar de forma intensiva. Para além de ser uma arte, há mesmo algo de mágico no silêncio; algo místico que que nos deixa inquietos e desconfortáveis. Perante o silêncio ficamos desarmados e completamente desorientados como se nos faltassem estrelas sonoras para guiar o nosso caminho. Ninguém quer saber daquele que tudo diz, mas sim daquele que se fecha por trás de um rosto enigmático e, claro, silencioso.
Desde pequenos que nos incentivam a quebrar o silêncio, a dar voz aos nossos sentimentos. Mas o que se pede hoje, mais do que se saber expressar com correção, é que se saiba ficar em silêncio e que se faça um ar calmo e sábio, como quem diz “já sabem que o que vou dizer vai ser brilhante por isso não esperem que diga coisa alguma. Maravilhem-se com os ritmos do meu silêncio.”
Se antes a oratória era treinada até à exaustão por quem pretendia entrar nos ofícios da política, hoje, em vez de se trabalhar a arte de falar em público, treina-se a arte do silêncio público. Este é subitamente analisado de todos os ângulos, por todos os canais disponíveis. Há mesmo, imaginem, especialistas em interpretações dos silêncios, que o analisam de diversos ângulos e usam termos técnicos e taxonomia adequada, que fazem do silêncio um sério candidato a uma nova ciência. Já consigo imaginar doutorados em silêncio ou mesmo mestres de ciência da não-comunicação.
Mas qual é a verdadeira vantagem do silêncio?
É que hoje todos fogem do compromisso; todos fogem do valor da palavra dada. Talvez fujam por reconhecerem o seu real peso e pelo seu valor ter sido desbaratado nos últimos tempos. Tomando o meu lugar de especialista do silêncio, vejo que os silêncios de hoje são silêncios de cobardia e medo; não são silêncios sábios, de quem tem o uso ponderado e sapiente das palavras dadas e dos intervalos de silêncio entre estas. Todos preferem o não-dizer, o não-opinar numa tentativa de um consenso falso e mesmo podre, uma vez que todos concordam com aquele que nada diz. Este que nada diz tem autoridade para tudo fazer, pois não irá contra nenhuma das suas convicções que o silêncio escondeu.
No entanto, o silêncio nada é mais do que intervalo entre duas locuções. Haverá uma altura em que o silêncio é quebrado, como também é inevitável a respiração. Não sabemos quando, nem quanto tempo ao certo demorará, mas sabemos que mais tarde ou mais cedo lá virá o seu fim. Aí, cai a máscara, cai o consenso, cai a farsa, formam-se lados. É assim que deve ser, atrevo-me a dizer. Gosto de quem diz com clareza ao que vai; concorde ou não com que diz.
Mas hoje há mais adeptos do silêncio: há mais adeptos daqueles que nada dizem. Interpreto isso como fraqueza, medo e porventura uma consciência profunda daquele ditado popular que se diz por aí: “Pela boca morre o peixe!”. E agora umas linhas de silêncio!
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Com estas linhas em branco ainda me arrisco a ganhar um prémio qualquer!

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