Crónicas antigas - A pedra mágica
Conta-se por aí que no meio das brincadeiras de um
domingo de sol, o outono apareceu fresco a pedir um agasalho e um chá bem
quentinho. Não dava para longas aventuras pois os dias eram já curtos, mas o
jardim da avó, que ficava bem pertinho, era sempre um bom local para esta
pequena curiosa explorar e brincar nas horas mais quentes.
Escondeu-se e encontrou quem se escondia. Contava os
números com prazer redobrado, de um a trinta e depois partia para descobrir a
avó, que estava sempre no mesmo sítio. No meio de tanta risota e corrida, a sua
cara refletia alegria e os seus olhos eram espelhos de luz. Ela era assim
quando não tinha as suas birras: contagiava a natureza sempre que sorria e a
natureza parecia sorrir de volta. Entendo, assim, a justiça do que aconteceu, a
natureza sabe recompensar quem a ama e a usa para amar.
Assim, no meio do jogo das escondidas, numa das vezes que
procurava a avó, ficou parada a olhar para o chão sem fazer qualquer barulho.
Agora, era a avó que a procurava, pois já tinha passado muito tempo desde que
tinha dito: «Alerta!» Encontrou-a de joelhos muito pensativa e olhando para a
sua pequena mão fechada verificou que tinha apanhado alguma coisa do chão e
perguntou: «Não me digas que encontraste algum tesouro.» E não é que tinha…
Levantou o olhar do chão e exclamou em voz alta a frase
que criou espanto a quem ouviu: «É uma pedra mágica!» A avó entrou na
brincadeira e perguntou se tinha encontrado uma pepita de ouro ou mesmo uma
pedra preciosa. Ela respondeu que não e abriu a mão, mostrando uma pedra banal,
castanha que nada tinha de especial. «É mesmo uma pedra mágica, não vês!»,
reafirmou a menina. A Avó sorriu, como só as avós sorriem para os netos, mas o
certo é que não via nada a não ser uma pedra, um pequeno calhau ainda coberto
com torrões de terra. Percebendo que a avó não acreditava nela, escolheu uma
parte mais clara do chão de cimento e com pedra mágica que tinha na mão começou
a fazer riscos no chão.
A avó, espantada, verificou que a menina, tinha acabado
de escrever o seu nome no chão. «Vês, é uma pedra mágica! É mágica porque é uma
pedra que escreve.»
Para mim, também tinha ficado claro: a pedra era
realmente mágica! Pensando agora sobre o assunto, na reflexão que a escrita
oferece, não posso deixar de concluir que magia é na verdade o que de
surpreendente conseguimos fazer, com o que à primeira vista parece banal.
Comentários